Da empresa pode dizer-se que é discreta, apesar dos 9 mil metros quadrados que ocupa em Fânzeres, no Porto. Quem ali passa, e se dela nada souber, não imaginaria que tem tanto mundo. O mesmo pode aplicar-se a Sérgio Neves, sócio maioritário da JNF – casa cuja principal atividade passa pela produção de ferragens para mobiliário e construção, que vai ao encontro das tendências da arquitetura contemporânea. Mas onde está a diversão até agora? É que quer o homem quer o espaço têm muito em comum. Não, esta não é só uma fábrica de dobradiças, puxadores e fechaduras. É um ninho de inovação e desenvolvimento. Onde se misturam máquinas topo de gama com cérebros dinâmicos, ávidos de mais, do melhor. Só o melhor. Uma história que (quase) só começou com o farmacêutico que não se estava a ver a passar a vida atrás de um balcão e decidiu plantar na cabeça do pai a ideia de mudança. Na verdade, ainda hoje é assim. Descontraído, mas atento. Simples, mas ciente da importância dos detalhes. Sérgio Neves deixa-se espicaçar pelos desafios. É dos que correm para ver o que está do outro lado da cortina. Quais são as tendências? Mais do que isso, quais as soluções? Materiais antimicrobianos, eliminação de processos químicos? Reduzir a pegada ambiental? Sim, mas não só. Falta o belo, a utilização do que é bom e português, a cerâmica, a cortiça. E porque não trabalhar também com a ourivesaria? Ninguém diria que para se fazer anunciar, à entrada da JNF, é preciso tocar um pequeno sino, pois não? Surpreendentes até nisso.
Como nasce a JNF?
A empresa surgiu como herança do padrasto do meu pai. É anterior a 1955. Depois, o meu pai fundou a própria empresa em 1965, ligada à indústria, no centro da cidade do Porto. O início dessa atividade foi com um nível de ferragens que não tem nada que ver com o que se utiliza hoje. Fazíamos fundamentalmente dobradiças de piano, muito grandes, de dois metros, e o nosso mercado era um mercado nacional, doméstico. Eu comecei a trabalhar na empresa em 1968, tinha 24 anos, após acabar o curso de Farmácia. Mas nunca me vi atrás de um balcão a vender medicamentos e achei que tinha mais perspetivas de realização pessoal a fazer crescer uma empresa pequenina, que eu achava que tinha bastante potencial. O meu pai aceitou o desafio, integrei a empresa e começámos a fazer um trabalho quase do zero. Na altura, tínhamos três funcionários. Hoje, somos 57.
Como é que se faz esse percurso?
Em várias fases. A mais fundamental e marcante foi em 1990. Foi quando resolvi ver o que se fazia nos outros países e, então, visitei várias feiras internacionais e reparei que Portugal estava muito isolado relativamente ao resto do mundo no que toca às ferragens. Comecei a enveredar um bocadinho pelo que se via lá fora. Achei que tínhamos de fazer uma ‘linkagem’ a outras empresas que tinham muito mais know how do que nós e de fazer algum tipo de parcerias, mesmo que fossem parcerias comerciais, porque isso iriam trazer muito valor à empresa a nível de conhecimento, de design e de tecnologia. Por isso, começámos a associar a nossa parte industrial a uma parte comercial, fazendo parcerias com empresas italianas, espanholas, francesas.
Começou assim a internacionalização?
Exatamente. Essa fronteira é de referir porque foi o deixar de ser uma empresa doméstica, circunscrita ao mercado nacional. Então, depois de termos celebrado alguns acordos comerciais, muitos deles com empresas de renome, começámos a dar-lhes mais protagonismo no mercado nacional. Desde que começámos a trabalhar o nosso grupo de produtos juntamente com outro tipo de produtos, verificámos que crescemos exponencialmente a nível nacional, porque não apresentámos uma ferragem meramente tradicional, apresentámos já um leque muito alargado que cobria uma área de mercado que não estávamos acostumados a tocar. Depois, outra fase bastante importante foi a do ano 2000, quando realizámos a primeira feira internacional, mas como expositores. Começámos a expor em feiras internacionais já com os nossos produtos, criámos linhas que se identificavam muito connosco.
"Éramos uma empresa ibérica, mas tínhamos uma linguagem mais nórdica. Penso que foi o principal motivo que nos fez diferenciar do restante”
Em que é que a empresa se diferenciava?
Focámo-nos em utilizar materiais e desenhos que não eram muito tradicionais. A usar um desenho muito minimalista, inspirado nos mercados nórdicos. A utilizar materiais que se usam nos mercados nórdicos – mais neutros, que não têm muitas formas orgânicas, mas formas mais geométricas –, e penso que foi esse um dos motivos pelos quais nos destacámos nas feiras. Éramos uma empresa ibérica, mas tínhamos uma linguagem mais nórdica. Penso que foi o principal motivo que nos fez diferenciar do restante.
Foi um risco…
Foi arriscado, mas o risco foi sempre controlado. Mantivemos sempre um diálogo muito grande com os nossos clientes. Ouvíamos muito do que eles nos contavam, do que precisavam e íamos ao encontro do que eles nos pediam. Nunca fomos uma empresa fechada, do género "é isto que produzimos, não estamos abertos a produzir mais nada”. Houve sempre muito diálogo com o cliente. E essa comunicação deu bons resultados.
Esse aproximar dos produtos às necessidades dos clientes verificava-se em quê? Para os mais desatentos, a JNF é uma empresa de ferragens, faz dobradiças, fechaduras… Mas, neste caso, é muito mais do que isso.
Pois, foi preciso outro salto. É que uma empresa na nossa área de negócios, se pensarmos do ponto de vista estereotipado, é uma empresa muito rudimentar. É como referiu: uma dobradiça, um puxador, uma fechadura. São produtos muito simples. Só que, quando começamos a entrar em mercados onde existem outros graus de exigência – porque os locais onde essas ferragens vão ser utilizadas são altamente técnicos, como, por exemplo, um hospital, um hotel, um aeroporto –, já se requerem critérios e regulamentações acerca dos tais produtos, ditos muito simples, que não são tão fáceis quanto podem parecer. Começam-se a exigir normas, certificações de qualidade. E, muitas vezes, também há uma responsabilização de quem produz a nível ambiental.
"Houve sempre muito diálogo com o cliente. E essa comunicação deu bons resultados”
Para este ano, quais as metas a atingir?
Hoje, talvez 70% da nossa faturação seja na Europa, um continente que está a envelhecer. Cada vez mais é necessário criar níveis de conforto para uma população que é cada vez mais envelhecida. E nós temo-nos concentrado muito em peças que trazem esse nível de conforto a pessoas que começam a ter mais dificuldades em fazer rotinas diárias. A nível de saúde, estamos a desenvolver vários produtos que podem ser usados em hospitais e clínicas e que trazem esse nível de conforto, prestando, de alguma forma, valor e qualidade de vida. E, relativamente à pandemia, que não podemos ignorar, criámos uma série de produtos que penso que vão perdurar nos próximos anos. É o caso do tratamento superficial antimicrobiano. Pensamos que, mesmo depois, na fase pós-COVID, vamos continuar a utilizar produtos antimicrobianos, porque ou há esta pandemia ou há outro vírus que nos vai criar situações que não podemos menosprezar e com as quais temos de nos habituar a viver.
A JNF apresenta-se como uma empresa que trabalha para o mercado contemporâneo, mas não esquece o mercado nacional. Por outro lado, com a utilização de azulejos e materiais portugueses, também leva Portugal além-fronteiras…
Isso é outra faceta da empresa. Aceitar desafios e trabalhar em parceria com outras áreas industriais. Uma delas foi a da porcelana. Fizemos uma busca pelo nosso património de azulejos, que é muito vasto, e fomos buscar alguns padrões que são utilizados nas casas do Porto e de Lisboa e pusemos vários puxadores a usar esses padrões e cores que são conhecidos por muita gente, como os azuis e os amarelos. Mas o trabalho mais arrojado que fizemos foi trabalhar com empresas de ourivesaria. Criámos uma coleção de puxadores com a Topázio, uma empresa com 150 anos, que tem padrões na arte da prata, prata cinzelada. Foi um processo interessante, porque não modificámos muitos desses padrões, fizemos foi uma fusão deles com alguns daqueles que já tínhamos e foi um sucesso.
Como nasce a JNF?
A empresa surgiu como herança do padrasto do meu pai. É anterior a 1955. Depois, o meu pai fundou a própria empresa em 1965, ligada à indústria, no centro da cidade do Porto. O início dessa atividade foi com um nível de ferragens que não tem nada que ver com o que se utiliza hoje. Fazíamos fundamentalmente dobradiças de piano, muito grandes, de dois metros, e o nosso mercado era um mercado nacional, doméstico. Eu comecei a trabalhar na empresa em 1968, tinha 24 anos, após acabar o curso de Farmácia. Mas nunca me vi atrás de um balcão a vender medicamentos e achei que tinha mais perspetivas de realização pessoal a fazer crescer uma empresa pequenina, que eu achava que tinha bastante potencial. O meu pai aceitou o desafio, integrei a empresa e começámos a fazer um trabalho quase do zero. Na altura, tínhamos três funcionários. Hoje, somos 57.
Como é que se faz esse percurso?
Em várias fases. A mais fundamental e marcante foi em 1990. Foi quando resolvi ver o que se fazia nos outros países e, então, visitei várias feiras internacionais e reparei que Portugal estava muito isolado relativamente ao resto do mundo no que toca às ferragens. Comecei a enveredar um bocadinho pelo que se via lá fora. Achei que tínhamos de fazer uma ‘linkagem’ a outras empresas que tinham muito mais know how do que nós e de fazer algum tipo de parcerias, mesmo que fossem parcerias comerciais, porque isso iriam trazer muito valor à empresa a nível de conhecimento, de design e de tecnologia. Por isso, começámos a associar a nossa parte industrial a uma parte comercial, fazendo parcerias com empresas italianas, espanholas, francesas.
Começou assim a internacionalização?
Exatamente. Essa fronteira é de referir porque foi o deixar de ser uma empresa doméstica, circunscrita ao mercado nacional. Então, depois de termos celebrado alguns acordos comerciais, muitos deles com empresas de renome, começámos a dar-lhes mais protagonismo no mercado nacional. Desde que começámos a trabalhar o nosso grupo de produtos juntamente com outro tipo de produtos, verificámos que crescemos exponencialmente a nível nacional, porque não apresentámos uma ferragem meramente tradicional, apresentámos já um leque muito alargado que cobria uma área de mercado que não estávamos acostumados a tocar. Depois, outra fase bastante importante foi a do ano 2000, quando realizámos a primeira feira internacional, mas como expositores. Começámos a expor em feiras internacionais já com os nossos produtos, criámos linhas que se identificavam muito connosco.
"Éramos uma empresa ibérica, mas tínhamos uma linguagem mais nórdica. Penso que foi o principal motivo que nos fez diferenciar do restante”
Em que é que a empresa se diferenciava?
Focámo-nos em utilizar materiais e desenhos que não eram muito tradicionais. A usar um desenho muito minimalista, inspirado nos mercados nórdicos. A utilizar materiais que se usam nos mercados nórdicos – mais neutros, que não têm muitas formas orgânicas, mas formas mais geométricas –, e penso que foi esse um dos motivos pelos quais nos destacámos nas feiras. Éramos uma empresa ibérica, mas tínhamos uma linguagem mais nórdica. Penso que foi o principal motivo que nos fez diferenciar do restante.
Foi um risco…
Foi arriscado, mas o risco foi sempre controlado. Mantivemos sempre um diálogo muito grande com os nossos clientes. Ouvíamos muito do que eles nos contavam, do que precisavam e íamos ao encontro do que eles nos pediam. Nunca fomos uma empresa fechada, do género "é isto que produzimos, não estamos abertos a produzir mais nada”. Houve sempre muito diálogo com o cliente. E essa comunicação deu bons resultados.
Esse aproximar dos produtos às necessidades dos clientes verificava-se em quê? Para os mais desatentos, a JNF é uma empresa de ferragens, faz dobradiças, fechaduras… Mas, neste caso, é muito mais do que isso.
Pois, foi preciso outro salto. É que uma empresa na nossa área de negócios, se pensarmos do ponto de vista estereotipado, é uma empresa muito rudimentar. É como referiu: uma dobradiça, um puxador, uma fechadura. São produtos muito simples. Só que, quando começamos a entrar em mercados onde existem outros graus de exigência – porque os locais onde essas ferragens vão ser utilizadas são altamente técnicos, como, por exemplo, um hospital, um hotel, um aeroporto –, já se requerem critérios e regulamentações acerca dos tais produtos, ditos muito simples, que não são tão fáceis quanto podem parecer. Começam-se a exigir normas, certificações de qualidade. E, muitas vezes, também há uma responsabilização de quem produz a nível ambiental.
"Houve sempre muito diálogo com o cliente. E essa comunicação deu bons resultados”
Para este ano, quais as metas a atingir?
Hoje, talvez 70% da nossa faturação seja na Europa, um continente que está a envelhecer. Cada vez mais é necessário criar níveis de conforto para uma população que é cada vez mais envelhecida. E nós temo-nos concentrado muito em peças que trazem esse nível de conforto a pessoas que começam a ter mais dificuldades em fazer rotinas diárias. A nível de saúde, estamos a desenvolver vários produtos que podem ser usados em hospitais e clínicas e que trazem esse nível de conforto, prestando, de alguma forma, valor e qualidade de vida. E, relativamente à pandemia, que não podemos ignorar, criámos uma série de produtos que penso que vão perdurar nos próximos anos. É o caso do tratamento superficial antimicrobiano. Pensamos que, mesmo depois, na fase pós-COVID, vamos continuar a utilizar produtos antimicrobianos, porque ou há esta pandemia ou há outro vírus que nos vai criar situações que não podemos menosprezar e com as quais temos de nos habituar a viver.
A JNF apresenta-se como uma empresa que trabalha para o mercado contemporâneo, mas não esquece o mercado nacional. Por outro lado, com a utilização de azulejos e materiais portugueses, também leva Portugal além-fronteiras…
Isso é outra faceta da empresa. Aceitar desafios e trabalhar em parceria com outras áreas industriais. Uma delas foi a da porcelana. Fizemos uma busca pelo nosso património de azulejos, que é muito vasto, e fomos buscar alguns padrões que são utilizados nas casas do Porto e de Lisboa e pusemos vários puxadores a usar esses padrões e cores que são conhecidos por muita gente, como os azuis e os amarelos. Mas o trabalho mais arrojado que fizemos foi trabalhar com empresas de ourivesaria. Criámos uma coleção de puxadores com a Topázio, uma empresa com 150 anos, que tem padrões na arte da prata, prata cinzelada. Foi um processo interessante, porque não modificámos muitos desses padrões, fizemos foi uma fusão deles com alguns daqueles que já tínhamos e foi um sucesso.